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terça-feira, 28 de fevereiro de 2012



POMBAL MARIA
PALAVRAS LAVRADAS

Experimentalista, poesia concreta, electrónica... E daí?

Há 12 anos Pombal Maria surpreendia-nos com um trabalho de grande criação e atitude literária, quando publicou “Asas de Sonho Ferido”.  Ressurge agora, mais amadurecido, com um novo título PALAVRAS LAVRADAS. Consta de poema/grafias que reelaboram a intenção primeira da obra primogénita.
As vezes excessivo no método, o autor retem-nos numa expressão formal, estruturalista, que depois nos conduz para um universo experimental-visual onde predomina uma estrategia cerebral e até uma lacónica percepção de desertificação da alma.
Sigo todas as direcções e anoto poemas que reverberam o sonho do poeta, muitos deles infinitamente belos, a exemplo de “Nós i os Deuses” (15); “Estranho Naufrágio” (17); “Texto do Dia” (27) “Meu Amor” (31); “ Má+Água” (49) entre outros tantos poemas raiando à perfeição estética, que me leva a perguntar o que fazem aqui textos menores/pretensos poemas, como o absurdo “Diálogo dos Mudos” (16) ou aquele desintegrado (porque cerebralmente forçado) “Poema Invisível na Lavra...” (18) etc.. Estes elaborados numa estrategia de exclusividade da expressão formal, sem que se leve em conta que verdadeiramente um poema espiritualiza e incorpora qualquer coisa transmissível do criador para o receptor.
Não confundamos: experiências (sub)literárias num paradigma que vem sendo trilhado há mais de 50 anos não significa tão logo Inovação. De modo nenhum. Ademais, tal paradigma só pode ser desconhecido e improvável mediante a ignorância, e esta serve a aqueles que não lêm senão o que fixam em espelhos de si próprios, sem o «entre nós» na condição de angolanos em si.
Ohandanji? Referido pelo prefaciador (Abre Paxe) Ohandanji foi um manifesto juvenil, ingênuo, apressadamente entendido como corrente literária, pendente sobre o experimentalismo pelo caminho exclusivista, mas legítimo, onde a estrutura e a escassez de conteúdos prevaleceriam sobre a intuição e o subjectivismo. São critérios então já explorados em várias dimensões e noutros países e que em muitos casos desemboca(va)m na Poesia Concreta. Apenasmente.
Bem, quanto ao resto... é poesia e PM tem-na muita!

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

CARMO NETO
DEGRAVATA "um estilo próprio"


Depois de algum tempo ausente deste espaço por razões próprias, eis-me já na recepção da aprazível obra de Carmo Neto que um amigo me ofereceu.


O toque estilístico em Degravata é peceptível, antes é o que esperava desde a competência figurativa que há mais de vinte anos captava do conto «meu réu de colarinho branco». Carmo Neto evolue entre a crónica e o conto, com uma certa avalanche humorística onde a exploração de uma época que remonta da infância é ensoberbecida pela nostalgia e pela memória que nos é lembrada da (sua) infância. E isso perpassa mais ou menos toda a obra.
Se serão contos ou crónicas, no meu entender a fronteira entre um e outro é tênue, cumpre-me sobretudo a função de captar o discurso estilístico funcional, ou seja a serviço da própria escrita e da expressão literária, que ombrea com os melhores contos de narradores angolanos. Leitura aconselhável, sim senhor.

terça-feira, 4 de outubro de 2011

AKIZ NETO, POESIA PORTA METAL

Akiz Neto nunca ousou tanto em "plastias poéticas" de suas metáforas, como no livro em epígrafe. Conhecido como poeta, crítico e ensaísta autodidacta, os seus trabalhos (a par da sua postura de colagem a escritores com destaque no poder político), eram bastantes contestados pela crítica, a exemplo de uma, bem recente, assinada pelo estudioso de literaturas afrolusófonas, o brasileiro Ricardo Riso, em trabalho que destaca o poemário "A Construção Figurativa do Gesto". Não se inibiu e vai daí que o seu autodidactismo empresta-lhe determinada percepção, a rigor da sua plenitude, e já como se se transfigura-se depois do imenso labor, eis a elaboração estética plasmada em muitos dizeres, marcas, gestos, imagens que, como diz Kátia Frazão quem  prefaciou o livro "pela percepção das cores e pela escuta de sons em seus ritmos múltiplos, na direcção do imprevísível.". Mais além, podemos nessa leitura encontrar enfoques da sensibilidade que lhe emprestam outras leituras, com influências e (talvez) confluências de um Manuel Rui, José Luis Mendonça, Conceição Cristóvão, João Tala, Abreu Paxe entre outros. Assim flue "brilha o ouro boca d'alvura / flores flautas fluem". Alguma versatilidade permite dispor os seus versos em vários quadros estruturais, fazendo com que a poesia aconteça de vários modos, "... de memórias simbólicas de teus lábios vibro. Eis por que danço com o espelho da alma...". E eis porque o poeta que reside em Akiz, não necessita de colagens autopromocionais dos almofadados políticos e... "Aí, a escrita, asa nua sobrea a ópera..." - Aqui sim.

sábado, 27 de agosto de 2011

SÓNIA GOMES, desde ERROS QUE MATAM à A FILHA DO GENERAL

A romancista SG, apesar de jovem tem já uma certa experiência ficcionista e é visível na sua atitude preocupações para com o social. É dos escritores mais presentes se levarmos em atenção a regularidade com que publica. Em "Erros que Matam" deixa-nos um aviso de que no seu ofício a opção primeira é a condição humana, daí a deslumbrante sociologia com que desemboca no romance a seguir, intitulado "A Filha do General". A literatura angolana não é rica de ficcionistas femininas ao contrário da sua poesia onde se tem destacado grandes criações poéticas de mulheres, daí toda a atenção e o seguimento paciente que recai sobre Sónia Gomes.
Na apreciação que faço à largueza da sua imaginação, a precisão da linguagem satisfaz o óbvio mas não será já uma obra de grande elaboração estética. Ainda assim, não concordo de maneira nenhuma com seus detratores que a caracterizam como simples "água açucarada", porém a relação que tabelece com a arte é ainda de baixo coturno.
A sua realização plena pode dar-se com o tempo mas é necessário que SG não encareça a leitura nos mais distintos continentes da (re)criação. Sim, porque para um escritor, qualquer leitura pode ser recriação, é ali que reside a alma da superação e da criatividade. É jovem, e quando se o é tudo dele se espera. Creio que os seus bajuladores (sim, que os tem) que até lhe deram uma bolsa "fraudulenta" de criação e que têm no escritor Adriano Botelho de Vasconcelos a face pública, deveriam, entre todas as virtudes do talento, indicar-lhe bons autores, para complementar alguma orientação informativa porque a literatura, sendo arte é uma viagem profunda na busca incessante do texto, ainda que não seja por uma "nova linguagem".
A competência pela realização estética perpassa uma dicção e uma actuação pessoais, daí que resulta nula a débil comparação com Pepetela, como foi na pobre análise de um certo escritor. Fica este conselho gratuito: SG, leia bons autores, sempre essenciais para a própria reorientação na elaboração estética.

quinta-feira, 4 de agosto de 2011

GOCIANTE PATISSA, A ÚLTIMA OUVINTE

Esse "livrinho" do Patissa caiu-me bem às mãos, encheu-me os sentidos e posso dizer que foi uma leitura prazeirosa. É como encontrar um oásis onde, de início, só há pedras. São contos e o primeiro deles, que dá título à obra seria apenas, por via da dúvida, uma beliscadela às minhas sensações. Então já cheirava água, flores, terra húmida, vestígios de poesia. Seguiram-se outros contos e agora sim, foi como se o primeiro não passasse de mera provocação à certa imaginação literária. Esse jovem, o Patissa, certamente está confiante e vai daí esboçando à rigor uma obra, textualmente de palavras cheias onde a forma e o simbolismo definem a intenção estética. Não preciso dizer mais nada. Aguardemos. Quatro, sim oiçam bem, quatro estrelas. É obra.

terça-feira, 5 de julho de 2011

DE "QUARTOS ESCUROS" - um blog achado ao acaso, texto de João Miguel Henriques

Abreu Paxe



Detenhamo-nos por ora ainda na língua portuguesa, dedicando desta vez um espaço ao poeta angolano Abreu Paxe (Vale do Loge, 1969), cuja obra me foi pela primeira vez dada a conhecer pela minha amiga paulista Nicole Cristofalo.

Agrada-me na poesia de Paxe, de cuja totalidade conheço apenas um punhado de composições, a escassez ou mesmo ausência de pontuação, o que transfere para o leitor essa árdua e ao mesmo tempo entusiasmante tarefa de ele próprio criar uma ou mais leituras possíveis dos textos, fazendo e refazendo sintagmas, unindo ou separando vocábulos. O facto de estarmos muitas vezes perante poemas de estrofe única, contribui de igual modo para o ritmo muito particular dos textos em causa. Poderíamos chamá-los de intimistas, ainda que por vezes herméticos e insondáveis. O conteúdo, aqui e ali codificado, é resgatado pela riqueza lexical e poética de inúmeras passagens, das mais belas que ultimamente tenho lido em português.

A revista electrónica Zunái, que goza de ligação directa nesta página, alberga de Abreu Paxe outros poemas, para além de uma entrevista e breve ensaio da responsabilidade do incansável Cláudio Daniel. Da primeira destas páginas consta igualmente uma nota biográfica do poeta que por esse preciso motivo aqui se evitou avançar. Não se evita porém, bem pelo contrário, a reprodução de dois poemas de Abreu Paxe. Não fosse o visitante pensar serem os quartos escuros absolutamente inúteis.



Em sexo livre a língua

entre as trevas e a seiva da sintaxe abundam palavras
inofensivas nada dizem à pátria por imitação os impérios
renovam os aspectos os tempos os modos
outro soldado emergia
unia a habitação a fonética e a fonologia ao sol de casa
pirâmides e intervalos o corpo cego texto
regenera cidades por visitar falida interacção
as meninas árvores nocturnas com portas e janelas polares
tudo treme sobre o papel a mesma travessia despersa tudo


De certo modo os destroços palavras

de igual modo as partículas invariáveis traços lábias
sempre há uma mulher no mal
por isso trepo meu olhar pelas paredes e pelo tecto
o último cruzar de pernas
zona prestigiada o eixo compreendia o acento de intensidade
juntos todos os sentidos no modo algum tempo exacto
sem esquecer na via erudita expressão
o étimo uma mesa com o portal aberto
outro reino de certeza
a comunicação oficial adoptou o berço lìngua lençol
tanto tempo sonorizado
estava inscrito nas fronteiras este período
das alíneas funções sintácticas
diferenças dos pares vocabulares
nascem outras partículas variáveis destroços

domingo, 3 de julho de 2011

JUVENTUDE, A LITERATURA "DELES"

Temos assistido a um empenhamento moderado da juventude nas coisas da literatura. Há jovens escrevendo mais, com frequência se publicam livros de autores novos. Isso é bom, porém, assistimos também a exageros colectivistas com o activismo que lhes são propensos, sem se levar em conta que é sempre depois, quando individualizados, a sós, que a dedicação de cada qual marcará pontos em direcção à própria evolução. Estou a falar para jovens que pretendem ser escritores ou para jovens escritores em busca de maiores aptidões, suficiência estética e até mesmo inovações. Desses jovens menciono os colectivos das Brigadas Jovens de Literatura (BJLA) e o grupo Lev'Arte que mais têm se apresentado ao público e até porque alguns dos seus integrantes, com destaque para o Nguimba Ngola, são verdadeiros incentivadores e cicerones da arte literária. O que me assombra, as vezes, são os excessos desse activismos com declamações públicas de poesia de forma grosseira, barulhenta, quase orgâsmica, com teatralizações que nos aproximam do xinguilamento ou do que a cultura kudurista tem de pior. A poesia perde assim em cadência e a palavra é tão-só mais espalhafatosa do que sensível. Nos anos 80 assistimos a um associativismo da juventude literária onde os procedimentos se centravam em tertúlias, debates, intervenções em boletins culturais, especialmente nos malogrados Vida & Cultura do Jornal de Angola e Lavra & Oficina da UEA, com troca de informações sobre o que ia pelo mundo avançado das criações estéticas, incentivação à leitura e à escrita, crítica, e até mesmo diatribes. Parecia um belo espectáculo. Já então se sabia que a leitura forjava a busca pela plenitude e devia constituir o fundamental de tais procedimentos. Eu lamento. Devem os jovens, hoje, estar mal orientados. Sinceramente. Perguntem-lhes o que andam a ler. Contudo, viva o activismo e viva a actividade.